Ismênia Ribeiro Schneider[1]
Daniela Schneider
Cristiane Budde
Iniciamos as publicações deste ano com uma matéria sobre alguns dos
escravos que residiram na Serra Catarinense e se relacionam com as famílias que
estudamos neste Blog. Na postagem anterior, descrevemos um pouco da história da
Invernada
dos Negros, território concedido a escravos e libertos por Matheus José de
Souza e Oliveira e sua esposa Pureza Emília da Silva.
Nesta matéria, apresentaremos alguns dos escravos que pertenceram a
famílias ancestrais serranas. Retomamos, portanto, a história de João Baptista
de Souza, mais conhecido como Inholo, proprietário da Fazenda “São João”, que
foi brutalmente assassinado, no dia 13 de agosto de 1850, por dois de seus
escravos, Ricardo e Alexandre.
Nota: Para
saber mais sobre a história do assassinato de Inholo, acesse: http://genealogiaserranasc.blogspot.com/2019/10/o-assassinato-de-joao-batista-de-souza.html
Inholo era rico estancieiro, dono de muitas terras e bens, dentre os
quais sobressaíam os “semoventes”, isto é, escravos e gados de todas as
espécies. Inholo deixou quatro filhos naturais, reconhecidos oficialmente, e mais
uma filha legítima.
Por ocasião de seu inventário, ainda em 1850, houve a partilha dos bens
entre os cinco filhos, pois sua esposa, que seria herdeira da metade de seus
bens, já havia falecido em 1845. Partilharam-se também seus 22 escravos. Dentre
os herdeiros, uma das filhas, ISMENIA BAPTISTA DE SOUZA, de quem esta
pesquisadora é descendente direta por linha masculina e feminina, recebeu em
sua legítima, a posse dos seguintes escravos de Inholo:
- LUIS, crioulo,
30 anos Valor:450$ 000 (quatrocentos e cinqüenta milréis);
- FLORENCIO,
mulato, 11 anos Valor: 450$000( quatrocentos e cinquenta milréis);
- GRACIANA,
crioula, 5 anos Valor: 250$000 (duzentos e cinquenta milréis).
Ismênia e seu marido, JOÃO DA SILVA RIBEIRO JÚNIOR, chamado Cel. JOÃO
RIBEIRO, compraram e/ou permutaram com os demais herdeiros toda a fazenda, mais
uma gleba grande de terras chamada “Invernada do Pelotas” que também fazia
parte do espólio de Inholo, tendo o casal herdeiro renomeado toda propriedade
como Fazenda SÃO JOÃO DE PELOTAS. Totalmente reconstruída, com todos os fechos
em taipas, de forma que ao ficar pronta, em 1858, tornou-se a maior sede de
fazenda da região. Quando, em cerca de 1915, a sua divisão entre os herdeiros começou,
bem como a venda das terras a estranhos, o apogeu do latifúndio declinou. Mas,
até hoje, toda a área da primitiva fazenda, de 120 milhões de metros quadrados,
permanece o Distrito São João de Pelotas, do Município de São Joaquim, às
margens do rio Pelotas, já na divisa com o Rio Grande do Sul, no município de
Bom Jesus.
Retomando a história dos escravos de Inholo, destaca-se a de Graciana
Garcia, que foi a escrava mais nova herdada por Ismênia Baptista de Souza e
pelo Cel. João Ribeiro. Graciana nasceu em junho de 1847 e foi batizada em 18
de setembro de 1847, em Lages.
Batismo de Graciana. |
Graciana era filha legítima de Manoel e de Jozefa, escravos de João
Baptista de Souza[2]. Sabe-se
também que Graciana tinha um irmão chamado Benedicto, dois anos mais velho que
ela, que foi batizado no mesmo dia, 18 de setembro de 18472. Os
padrinhos de batismo dos dois irmãos foram Manoel Bernardes de Souza e Maria
Gonçalves do Espírito Santo.
Graciana teve nove filhos, embora
nunca tenha se casado oficialmente. Ela viveu primeiramente, de maneira
marital, com José Velho, com quem teve os seguintes filhos[3]:
F 1 – EUFRÁSIO, c.c.
1ª esposa: CLAUDIANA MARIA DE
JESUS, filha de João Pedro Lucrécio e D. Antonia Maria de Jesus. João Pedro Lucrécio
foi o pedreiro que contribuiu com a construção da Igreja Matriz de São Joaquim.
Residia na região da Brusca, no Quarteirão de São Mateus, na Fazenda São João
de Pelotas. Filhos: João Maria e Laurindo.
2ª esposa: JOAQUINA.
F 2 – LOURENÇO;
F 3 – JOSEFA JOSÉ GARCIA.
Algum tempo depois Graciana passou a viver em companhia de Vidal Pereira,
sendo que desta união nasceram os filhos2:
F 4 – FELIPE;
F 5 – PAULA;
F 6 – GERTRUDES, c.c. VERÍSSIMO JOSÉ PEREIRA.
A família residia no Rincão dos Quatis, na aludida fazenda, a
aproximadamente oito quilômetros da sua sede.
Filhos de Gertrudes e Veríssimo:
N 6.1 – JOSÉ VERÍSSIMO, c.c. sua prima CAROLINA GARCIA.
N 6.2 –
GRACIANA VERÍSSIMO, c.c. JOÃO HENRIQUE DE OLIVEIRA, filho de Januário Henrique
de Oliveira e Joaquina Maria de Jesus.
F 7 – JOAQUINA;
F 8 – SELVINA[i] (nasceu
em 1878, batistério em 25-05-18802), c.c. AMADO[4].
Filhos de Selvina[ii]:
N 8.1 – IRINÉIA4;
N 8.2 – CECÍLIA GARCIA[5];
N 8.3 – AMADO GARCIA4;
N 8.4 – CAROLA GARCIA4;
N 8.5 – ISOLINA GARCIA4;
N 8.6 – VIDAL GARCIA3.
F 9 – AMADO GARCIA PEREIRA.
Segundo dados de Enedino Batista Ribeiro[6],
os filhos de Vidal, com exceção de Selvina, já eram falecidos em 1959. Vidal, o
segundo companheiro de Graciana, faleceu afogado no rio Lavatudo no dia 2 de
agosto de 1887, quando tentava resgatar uma rês que havia se perdido da tropa, que
seria entregue na Coxilha Rica, do outro lado do rio.
No dia do trágico acontecimento estava marcado o casamento de João
Batista Ribeiro de Souza (filho do dono da Fazenda São João de Pelotas, o Cel.
João Ribeiro) e Cândida dos Prazeres Batista de Souza, pais de Enedino. O
falecido, contudo, era grande amigo de João Batista e o fato atingiu toda a
família. Em virtude disso, adiou-se o matrimônio em quatro dias, pois não era
possível adiar mais, visto que estavam todos os convidados já localizados na
Vila de São Joaquim e todos os preparativos já estavam concluídos.
O casal João Batista e Cândida, em sinal de amizade e afeto ao falecido,
criou os dois últimos filhos de Vidal Pereira, que ainda eram bem pequenos:
Selvina e Amado Garcia Pereira. Selvina, anos mais tarde, foi ama-de-leite de
Enedino, e também teve uma filha chamada Irinéia, da mesma idade que Enedino,
de quem ficou amiga quando ele foi passar uns tempos na casa da “Tia” Selvina,
no Rincão dos Quatis.
Graciana, segundo Enedino Batista Ribeiro, viveu até cerca de 85 anos. Os
filhos dela já nasceram na vigência da Lei do Ventre Livre (Lei nº 2040),
promulgada em 28 de setembro de 1871. Essa lei determinava que os filhos de
escravas nascidos após a data de promulgação da lei deveriam ser livres, e,
além disso, instituía a possibilidade de um escravo comprar a sua alforria, etc[7]. Selvina passou grande parte de sua vida
trabalhando com a família Ribeiro, mesmo quando todos se mudaram para a cidade
de São Joaquim. Ela tinha uma relação afetuosa com a família Ribeiro, e trabalhou
como doméstica principalmente com a família de Candoca, filha do casal João
Batista de Souza e Cândida dos Prazeres Batista de Souza, passando depois para
a família de Enedino. Com Lydia Palma Ribeiro e Enedino, Selvina trabalhou até
1944, quando a família Ribeiro se mudou para Florianópolis.
Selvina transferiu domicílio para a cidade de São
Joaquim para trabalhar, sempre residindo na Rua Francisco Pinto de Arruda.
Selvina, filha de Graciana. |
Referências
[i] No seu registro
de batismo consta SERVINA, mas ela ficou conhecida na família como SELVINA.
[ii] Talvez
Selvina tenha tido mais filhos, mas até o momento só se descobriram o nome
desses seis.
[1] Este texto
foi originalmente publicado no livro “O Voo das Curucacas”, sendo remodelado
para esta publicação. Referência do livro: SCHNEIDER, Ismênia Ribeiro. O Voo das Curucacas: Estudo Genealógico
de Famílias Serranas de Santa Catarina. Florianópolis: Letra Editorial, 2013.
Coleção Memória Familiar, INGESC, v. 1, 292p.
[2] FAMILY
SEARCH, Igreja de Jesus Cristo dos Últimos Dias. Registros históricos. Lages, Nossa Senhora dos Prazeres, Batismos de
Abril de 1847 a Dezembro de 1850. Disponível em: https://www.familysearch.org/ark:/61903/3:1:939Z-YT29-M?i=26&wc=11578486&cc=2177296.
[3] DEPOIMENTO
de Selvina à Enedino Batista Ribeiro, 20-02-1959. Acervo pessoal de Ismênia
Ribeiro Schneider.
[4] Dados
fornecidos por Hamilton Vieira e Virgínia Flores Vieira.
[5] Dados
fornecidos por Gorette, uma das descendentes de Selvina.
[6] RIBEIRO,
Enedino Batista. Gavião-de-Penacho:
memórias de um serrano. Instituto Histórico e Geográfico de Santa Catarina;
co-edição da Assembléia Legislativa do Estado de Santa Catarina. Florianópolis:
Instituto Histórico e Geográfico de Santa Catarina, 1999.
[7] AMARAL, Sharyse Piroupo. Escravidão,
liberdade e resistência em Sergipe: Cotinguiba, 1860 - 1888. 2007. 272 f. Tese (doutorado em História) –
Faculdade de Filosofia e Ciência Humanas da Universidade de Bahia. Salvador,
2007.
Parabéns pelo belíssimo trabalho de pesquisa.
ResponderExcluirMuito obrigada!
ExcluirFicamos muito felizes em receber o comentário!
Grande abraço,
Ismênia e equipe.
Boa noite Ismenia, tudo bem??
ResponderExcluirPelas minhas recentes pesquisas creio que sou descendente de Graciana também.
Podemos conversar mais sobre o assunto? Tenho muito interesse em compartilharmos essa história.
Grande abraço.
LiaGreice