quarta-feira, 6 de junho de 2012

SÃO JOÃO DE PELOTAS

                                                                     Por Ismênia Ribeiro Schneider       
         
             No dia nove de setembro de 1845, João Baptista de Souza (1800 – 1850), INHOLO, comprou de Constantino Luiz Duarte e de sua mulher, D. Maria do Espírito Santo Ávilla, uma grande gleba de terras na confluência do rio Pelotas com o Lavatudo, chamada pelos proprietários “Fazenda Coqueiros”, renomeada por Inholo “Fazenda São João”, que se tornou seu domicílio, apesar de possuir na Coxilha Rica, em Lages, várias outras fazendas. Ali morava com os quatro filhos de sua primeira união estável, mas não oficializada com Maria Gonçalves do Espírito Santo: Maria Benta, Ismênia, Maria Magdalena e Marcos, mais Júlia, a filha que teve com sua segunda mulher, a esposa legítima, que acabava de falecer naquele ano, Cândida dos Prazeres Córdova.
            Por ocasião de seu inventário, após o seu assassinato em 13 de agosto de 1850, essa grande fazenda foi herdada pelos quatro filhos naturais. Ismênia havia se casado com o primo-irmão, João da Silva Ribeiro Júnior (1), mais tarde conhecido como “Coronel João Ribeiro”, que, não sabemos ainda como, mas provavelmente por permuta e compra, adquiriu toda a propriedade dos demais herdeiros, passando a denominá-la SÃO JOÃO DE PELOTAS. Todo o seu território, bem mais tarde, se transformou num distrito do município de São Joaquim, com o mesmo nome. Em 1858, a nova sede mandada construir pelo Coronel João Ribeiro estava pronta. Para defesa do frio intenso da região, a maioria das fazendas localizava-se em zonas baixas, e assim aconteceu com São João de Pelotas: do alto das coxilhas que a rodeavam avistava-se um impressionante conjunto de casa, benfeitorias e taipas, tudo em “pedra-ferro” (basalto), sede de fazenda que se transformaria em referência na Região Serrana. As ruínas das taipas ciclópicas atestam ainda a grandiosidade do que foi o latifúndio construído por João da Silva Ribeiro Júnior.
            João (1819–1894) e Ismênia (1832–1920) tiveram dez filhos, dos quais apenas dois eram homens, AFFONSO DA SILVA RIBEIRO e JOÃO BATISTA RIBEIRO DE SOUZA (1860–1944), conhecido na região por “Coronel Batista”, “Seu Batista”, que, por morar, em São João de Pelotas, de 1900 a 1909, tornou-se o curador da mãe, Ismênia, que aos 62 anos ficou doente das faculdades mentais. Ali nasceram os dez filhos que teve com sua mulher CÂNDIDA DOS PRAZERES BAPTISTA DE SOUZA, também prima-irmã, pois era filha de MARCOS BAPTISTA DE SOUZA, irmão de Ismênia. Nesse período, Seu Batista foi responsável pelos mais de cento e vinte milhões de metros quadrados de terras e por cerca de 2.600 cabeças de gado.
           São João de Pelotas permaneceu em poder da família de 1845, quando foi comprada por INHOLO, até mais ou menos 1925, portanto, por cerca de 80 anos, quando começou a ser vendida. Uma pequena parte, felizmente, com ela continua, nas pessoas de Hamilton José Palma Vieira, “Titinho”, Hercílio Vieira Neto, “Hercilinho”, e Clóvis Edu de Palma Vieira, “Clovis”, netos de Maria Cândida Ribeiro Vieira, “Candoca”, que ao comprar de seu pai, “S. Batista”, através de seu marido, Hercílio Vieira do Amaral, a parte da fazenda denominada “POSTO”, conseguiu preservar por 151 anos, com a família, um pedaço daquelas terras, sagradas para os descendentes.
            Conhecedores da saga da família RIBERO naquelas paragens, pode-se compreender a nostalgia de seu descendente Enedino, quando escreve em suas memórias:
            “Tudo ali, na histórica Fazenda de SÃO JOÃO DE PELOTAS ainda se pode ver, tocar e sentir, na confrangedora lembrança das coisas grandiosas que passaram e não voltam mais! Tristeza e melancolia ali recendem, principalmente para quem nesse lugar nasceu e passou a quadra risonha se sua primeira infância, no aconchego de entes queridos, que também passaram e não voltam mais!”
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            Esclarecimentos sobre os parentescos citados acima, importantes para se compreender quando e como ocorreram essas uniões entre Ribeiros e Souzas. Tudo começou ao redor do ano de 1755, quando MANOEL DA SILVA RIBEIRO e MATHEUS JOSÉ DE SOUZA compraram fazendas próximas na região que era conhecida apenas como “Costa da Serra”, hoje Bom Jardim. A região era montanhosa, completamente isolada. A única cidade existente era Lages, a cerca de 28 léguas, isto é, a mais ou menos 180 km de distância, com a qual só havia comunicação a cavalo, em território dominado ainda pelos índios, por animais selvagens, matas fechadas, com grandes distâncias entre fazendas, etc. Todos esse problemas ocasionaram que quando chegava a idade casadoura dos jovens, a amizade que a necessidade de mútua proteção estabelecia entre as famílias, propiciava o casamento entre os seus filhos. E assim aconteceu entre os vizinhos Ribeiros e Souzas: o sétimo filho de Pedro da Silva Ribeiro e de Ana Maria de Saldanha, JOÃO DA SILVA RIBEIRO “Sênior” (1787 – 1868) casou-se com a segunda filha de Matheus José de Souza, MARIA BENTA DE SOUZA (1790 – 1857). O filho desse casal, JOÃO DA SILVA RIBEIRO JÚNIOR (1819 – 1894) casou-se com ISMÊNIA BAPTISTA DE SOUZA (1832- 1912), filha do já citado JOÃO BAPTISTA DE SOUZA, “Inholo”, irmão de Maria Benta, a mãe de João Júnior. Na geração seguinte, o filho de João/Ismênia, o “Coronel Batista”, JOÃO BAPTISTA RIBEIRO DE SOUZA (1860 – 1944) casou-se com a também prima-irmã, CÂNDIDA DOS PRAZERES BAPTISSTA DE SOUZA, filha do irmão de Ismênia, MARCOS BAPTISTA DE SOUZA (1833 – 1906) (2), casado com mulher fora das duas estirpes, MARIA RODRIGUES DE ANDRADE, “D. Marica”, uma figura excêntrica, muito forte. Usava sempre revólver na cintura e tomava conta das duas fazendas de sua família enquanto “Mano Marcos”, como chamava o marido, viajava para tratar de negócios e temas políticos de seu Partido, o Conservador, do qual era Presidente. O domicílio da família era a Fazenda “Santa Maria”, em Bom Jesus, RS. A Fazenda de SC, “São Pedro”, era dividida da anterior pelo rio Pelotas. Diz uma “lenda” familiar que “D. Marica” matava os escravos faltosos, e os enterrava nas cozinhas, e quw foram encontrados ossos na casa da Fazenda “São Pedro”, quando foi demolida. Lenda ou verdade?... Conhecendo os traços de caráter dessa ancestral, dá para entender um pouco a força de sua filha, D. Cândida dos Prazeres Baptista de Souza, esposa do “Coronel Batista”, senhora de São João de Pelotas no começo do séc. XX, que costurava barrigas de cavalos, encanava ossos com perfeição, fazia partos, dava remédios, enfim, atendia a todos na propriedade aonde viveu boa parte de sua vida de casada.
            O estudo das gerações sucessivas dessas famílias joaquinenses extrapola o simples levantamento e registro de nomes “mortos”, para o desvendar ante os olhos atônitos de seus descendentes da história de vida, os amores, as tragédias, as dores, as alegrias, as realizações de alguns milhares de homens e mulheres que os antecederam na corrente da vida...

Texto escrito em Florianópolis, maio de 2006, comemorativo da abertura da Rodovia Enedino Batista Ribeiro, trecho da SC-438, entre o Rio Caveiras e o Rio Lavatudo, Município de Painel, num percurso de 33 km.
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Notas:
(1)   JOÃO DA SILVA RIBEIRO JÚNIOR, “Coronel João Ribeiro”, foi um dos mais ricos fazendeiros do seu tempo, além de importante político, chefe do Partido Conservador no tempo do Império, depois, já na República, Partido Republicano. Fez parte do grupo de fazendeiros que fundou São Joaquim, em 1 de abril de 1873 (emancipado de Lages em 31 de março de 1886). Foi o presidente do Conselho Fiscal, nomeado para arrecadar fundos para a construção da Igreja. Foi o segundo Prefeito do Município, de 1891 a 1995. seu nome passou a designar a praça central, tanto da cidade de São Joaquim como da de Lages.
(2)   MARCOS BAPTISTA DE SOUZA distinguiu-se como grande estancieiro e chefe político, substituto de João Ribeiro, após a morte deste, na chefia do Partido Republicano. A “rua Marcos Batista”, em São Joaquim, é assim denominada em sua homenagem.

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